Como a mídia influencia o que você pensa e faz

Pode ser que ao chegar no final desse artigo você tenha mais perguntas que respostas. Isso é normal ao tratarmos de um tema tão complexo como a comunicação humana. Nessa área existem mais incertezas que certezas, o que se acredita hoje, amanhã pode ser contestado. Mas, em resumo aqui é colocado que a mídia pode afetar suas emoções, pensamentos e comportamentos, mas você é quem decide o como e se isso se dará.  

Introdução

Por volta de 1930 acreditava-se que as mensagens transmitidas pela mídia (rádio e TV) tinham o poder de entrar na mente das pessoas, mesmo sem se darem conta disso, e afetava suas emoções e comportamentos. Os meios de comunicação injetavam ou disparavam na cabeça da sociedade mensagens subliminares que modelavam seus hábitos e decisões. O ser humano era uma vítima passiva e indefesa dos ataques de Hollywood e das organizações de comunicação em massa.  Essas teorias se fundamentavam em parte no sucesso de Hitler durante o nazismo.  

Atualmente essas teorias já foram descartadas é são consideradas como uma falácia ou mito. Estudos ao longo dos anos tem confirmado que influenciar a mente humana não é tão simples assim.  Então se você ainda crê na mídia dessa forma, deixe-me ajuda-lo a descobrir novas perspectivas.

Imagem: ShutterStock

Poder da decisão individual

Em 1940, Paul Lazarsfeld pesquisou como uma campanha política no rádio poderia determinar a escolha do presidente dos Estados Unidos. Ele descobriu que a mídia serviu apenas para reforçar as decisões que as pessoas já tinham feito em suas mentes, ou seja, elas se expunham e compartilhavam aquilo que haviam previamente selecionado.  Seria como dizer atualmente que o número de postagens no Facebook pode influenciar, mas não determinar a escolha do presidente. O indivíduo é livre e tem poder para escolher se aceita ou não a mensagem exibida.

A mídia, a família e os amigos

Pesquisas seguintes reforçaram que existem fatores mais poderosos que a influência da mídia. Uma delas mostrou que familiares e amigos afetavam o impacto das mensagens da mídia. Para boa parte das pessoas é mais importante o que os amigos pensam do que o que a mídia diz. As pessoas não recebem as mensagens de forma passiva. Elas também validam a mensagem com alguém que elas respeitam[1].

A mídia e as emoções

No entanto, em 1980 alguns teoristas observaram que a mídia é capaz de estimular reações emocionais como medo, raiva, alegria e luxúria. Esse estímulo emocional, quando elevado, pode levar tempo para se dissipar e amplifica qualquer estado de ânimo que sentimos depois. Por exemplo, se um homem assistiu um filme violento e logo após ele se irrita com sua esposa, é possível que apresente ira que leve a violência doméstica. Após assistir uma cena erótica, é possível que deseje repeti-la. A pesquisa também revelou que homens e mulheres podem apresentar reações emocionais diferentes em relação a um mesmo conteúdo[2].

É importante ressaltar que o problema maior não é a cena de um filme transmitir uma mensagem negativa, mas sim a glorificação do que é errado. Em algumas histórias é importante apresentar aspectos negativos com o objetivo de mostrar mais tarde as terríveis consequências da ação. O ladrão roubou o carro, mas no final foi preso. Portanto, não roube ou vai sofrer tristes consequências. Um filme com o tema sobre o racismo ou escravidão do século 19 pode mostrar cenas de injustiça e violência com o objetivo nobre de nos fazer refletir sobre isso e a não repetir a história.

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A mídia e as motivações

Embora pareça que o efeito positivo ou negativo da mídia ocorra num curto prazo, logo após a exposição ao conteúdo, o psicólogo Albert Bandura argumenta que o que aprendemos na mídia fica armazenado em nossa mente e podemos manifestar isso anos depois. Por exemplo, uma pessoa que nunca pegou numa arma, mas que assistiu um vídeo mostrando como preparar uma arma para ser usada, ao se deparar com uma situação real irá usar as informações que tem na mente. O conhecimento estava guardado a muito tempo, apenas aguardando a motivação para se manifestar em ação[3].

Embora vários estudos demonstrem os resultados da mídia no comportamento das pessoas, como explicar que nem todos os que assistem cenas de assassinato se tornam assassinos e nem todos que gostam de séries médicas se tornam médicos. Alguns responderiam a isso como sendo falta de motivação ou oportunidade.  Porém, Bandura acrescenta que existem outros fatores que se interpõem entre o conhecimento e a ação. Por exemplo, se uma criança joga games violentos, mas os pais, professores e a sociedade desaprovam a agressão e punem esse comportamento, o efeito da mídia será diminuído. Em outras palavras, são necessárias várias forças internas e externas somadas para influenciar e moldar nosso comportamento.

A mídia e o comportamento das crianças

Bandura fez um experimento onde observou como as crianças pequenas imitam o que assistem na TV. Foi colocado diante delas um vídeo mostrando adultos batendo e espancando um joão-bobo/teimoso (boneco inflável). Depois disso elas recebiam o mesmo brinquedo e podiam brincar com ele. O resultado é que as crianças imitaram o mesmo comportamento violento e agressivo exibido pelos adultos.

Existem várias críticas a esse experimento. Um deles é que o boneco usado tem exatamente o propósito de receber pancadas, então não se poderia esperar atitude diferente das crianças. No entanto, independente da questão da violência, esse estudo é relevante por mostrar o fenômeno da imitação. Acredita-se que os modelos exibidos nas mídias podem influenciar (não determinar) o nosso comportamento. E isso também vale para o que é positivo. Ao exibir modelos positivos a mídia pode contribuir para a solução de vários problemas da sociedade (ética, moral, ecologia, saúde, etc.).

A mídia e o comportamento dos adultos

As crianças são reconhecidas como sendo mais suscetíveis aos efeitos da mídia, porém os efeitos de imitação também ocorrem entre os mais velhos. Pesquisas esclarecem que as mortes de celebridades por suicídio e overdose de drogas quando são altamente divulgadas, são seguidas por um ligeiro aumento de mortes pelo mesmo motivo. As notícias de atentado terrorista aumentam a violência política. A larga divulgação de acidentes aéreos aumenta o número de acidentes automotivos em rodovias [4].

Duração da influência da mídia

Os teóricos ainda não estão de acordo sobre o tempo de permanência dos efeitos provocados pela mídia, ou seja, quanto tempo dura a influência de um conteúdo. Por quanto tempo ficamos tristes após ver um filme dramático, violentos após uma notícia policial ou rindo após uma comédia?  Não se sabe ao certo, mas alguns imaginam que o efeito pode ser de curto prazo, a menos que os estímulos sejam repetitivos e o comportamento seja reforçado ou internalizado de forma voluntária.

As mídias como catarse

Existe uma teoria de que defende o efeito de catarse das mídias. Isso quer dizer que a violência em filmes e programas pode ser saudável a medida em que libera impulsos, sentimentos e emoções reprimidas e destrutivas.  O problema com essa teoria é que não existem evidências que a apoie. Os estudos que tentam mostra como altas doses de violência televisada reduz comportamentos violentos acabam mostrando o oposto. As pessoas se sentem melhor, mas se tornam piores[5].

“Somos transformados pela contemplação – essa é uma lei, tanto da natureza intelectual quanto da espiritual. A mente vai se adaptando aos assuntos com os quais se ocupa”

(Ellen G. White, O Grande Conflito, p. 555)
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As mídias e a violência contra as mulheres

O “mito do estupro” é um dos efeitos antissociais da mídia pornográfica. Embora, os homens que utilizam a pornografia estejam diante de provas esmagadoras e notícias frequentes de que as mulheres estão aborrecidas e rejeitam fortemente a mera ideia de agressão sexual, eles podem acreditar que as mulheres sequestradas, agredidas e violentadas sentem prazer e experimentam êxtase sexual por seus raptores. Para eles o sexo precisa ser violento para se experimentar o prazer. Embora filmes de sexo explícito sejam utilizados por clínicas de disfunção sexual para diminuir as inibições e ensinar técnicas de preliminares, Bandura adverte que a exposição contínua à fantasia erótica pode dificultar a satisfação sexual. A paixão selvagem simulada, retratada nos filmes, cria uma expectativa exageradamente alta, que não pode ser igualada por um amor normal[6].

Conclusão

Entender como as mídias podem influenciar as emoções, pensamentos e comportamento humano é algo muito complexo. Não é possível esgota-lo com apenas um artigo, livro ou pesquisa. A comunicação humana é muito complexa para ser explicada de forma tão simples. Cada pessoa carrega dentro de si um conjunto de experiências, emoções e características biológicas que a tornam singular no planeta. É por esse motivo que não se pode afirmar categoricamente que o efeito gerado pela mídia é igual e na mesma intensidade para todos. O que pode ser negativo ou positivo para um, pode não ter o mesmo efeito para outro.

A mídia também não é o único fator pelo qual as crianças e adultos adquirem comportamentos negativos, mas certamente é um ingrediente importante e que precisamos estar atentos. O que se aprende hoje, pode estar se praticando amanhã. Para os pais eu deixo como sugestão o exemplo da antiga cultura hebraica de passar valores positivos para os filhos repetindo e reforçando constantemente. Esse gesto pode ser um antídoto protetor para os filhos quando estiverem sem supervisão e se depararem com mensagens que os estimule a imitar comportamentos negativos e prejudiciais.

E estas palavras, que hoje te ordeno, estarão no teu coração; E as ensinarás a teus filhos e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e deitando-te e levantando-te.

Deuteronômio 6:6,7
Imagem: ShutterStock

Referências

[1] Erie County Study, 1940. https://www.icpsr.umich.edu/web/ICPSR/studies/7204

[2] Mood Adjustment to Social Situations

Through Mass Media Use: How Men Ruminate and Women Dissipate Angry Moods.  http://terpconnect.umd.edu/~nan/738readings/Knobloch-Westerwick%20Alter%202006%20mood%20adjustment%20media%20use.pdf

[3] Social learning theory. Albert Bandura. Prentice-Hall. 1977.

[4] As Armas da Persuasão: Como Influenciar e Não Se Deixar Influenciar (Influence: Science and Practice)

[5] Social learning theory. https://www.afirstlook.com/docs/sociallearning.pdf

[6] Pornography and sexual aggression. https://www.sscnet.ucla.edu/comm/malamuth/pdf/00arsr11.pdf 

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