Os adolescentes e as mídias digitais

Esse artigo é sobre os adolescentes, mas não é para adolescentes. Será mais útil para os pais e educadores preocupados em entender o lado positivo e negativo das mídias digitais na vida dos adolescentes.

Introdução

O mundo mudou muito nas últimas décadas. As mídias digitais (Internet, celulares, videogames, etc) se somaram às mídias tradicionais (rádio e TV) e ainda estamos aprendendo a lidar com elas na educação e formação das novas gerações. Devo deixar meu filho usar computador? Internet vicia? Quando é seguro deixar meu filho ter uma conta nas redes sociais?

As mídias tradicionais como o rádio e a TV tem muitas diferenças das digitais. Antes nos sentávamos passivamente diante de uma TV e, por horas, assistíamos a um único programa. Hoje, crianças e adolescentes interagem com a mídia, navegam entre vários conteúdos, criam seus próprios vídeos e memes, tudo ao mesmo tempo. É algo mais ativo e participativo, porém também mais arriscado que antes.  

O crescimento do uso das mídias digitais em tão pouco tempo surpreende aos especialistas. Por volta de 1970, em média, as crianças começavam assistir TV aos 4 anos de idade. Atualmente elas começam a interagir com as mídias digitais aos 4 meses. Em 2015, um estudo americano, com famílias de baixa renda, mostrou que 75% das crianças entre 0 a 4 anos de idade já possuíam seus próprios celulares [1]. No Brasil, em 2018, 86% da população entre 09 e 14 anos já usava a Internet[2].

Imagem: Shutterstock

Fato é que as mídias digitais estão alterando nossos conceitos. A comunicação está mudando do cara-a-cara para o tela-a-tela. O uso da mídia está deixando de ser apenas para o entretenimento e se tornando obrigatório para a educação, formação profissional e trabalho. Se as usar representa risco, evitar é algo ainda mais perigoso, principalmente para as novas gerações.

Felizmente, as novas mídias também têm benefícios, mas estes dependem em grande parte da idade, do estágio de desenvolvimento, de como são usadas, do tipo de conteúdo e do design da mídia.

Os adolescentes são diferentes

Eles se sentem e são de fato diferentes das crianças e dos adultos. Nessa fase eles gastam mais tempo com os amigos e com a mídia do que com os pais. Estão na fase da busca da própria identidade e encontram nas mídias um lugar para essa expressão e influência.  Ao experimentarem formas de expressão on-line, os adolescentes podem estar trabalhando através do processo psicossocial de entender quem são e como se sentem sobre sua identidade emergente. Mas, olhando por uma perspectiva mais negativa, eles também podem se tornar alvo de mensagens da mídia com incentivo ao consumo de fumo, álcool, drogas, atividade sexual libertina, uso de armas e etc.

Os adolescentes pensam ser invulneráveis. Eles não acreditam que coisas ruins podem acontecer com eles e creem que controlam toda situação. Essa percepção os coloca em risco como acidentes de carro, gravidez na adolescência, dependência de drogas, vício em pornografia e outros. Embora existam vários fatores que colaborem com esses riscos, a mídia é percebida com um dos principais.

Por exemplo, os adolescentes são mais propensos que os mais velhos a brincar com sua identidade nas redes sociais. Também são mais propensos a conversar com estranhos na Internet.

Imagem: ShutterStock

Adolescentes e as mídias digitais

Os adolescentes de hoje estão imersos tanto nas formas tradicionais como nas novas formas de mídia digital. Essas novas mídias oferecem tanto benefícios quanto riscos para a saúde do adolescente. Os benefícios incluem aprendizagem precoce, exposição a novas ideias e conhecimentos, maiores oportunidades de contato e apoio social, e novas oportunidades de acesso a informações de promoção da saúde. Os riscos de tais meios incluem efeitos negativos sobre o sono, atenção e aprendizagem, maior incidência de obesidade e depressão, exposição a conteúdos e contatos imprecisos, inapropriados ou inseguros e comprometimento da privacidade e confidencialidade.

Os adolescentes podem realmente melhorar seu pensamento cognitivo gastando tempo com certas tecnologias. Estudos mostram que a prática de certos tipos de videogames pode melhorar as habilidades espaciais dinâmicas tanto em adolescentes quanto em adultos[3]. Há também evidências de que o jogo de videogame melhora o pensamento estratégico e a atenção visual, presumivelmente porque os “gamers” devem lidar com eventos que ocorrem simultaneamente em diferentes lugares na tela[4]. Além disso, ouvir uma música parece estimular mais a imaginação do que assistir a um vídeo musical da mesma música[5]. Todos estes estudos sugerem uma espécie de relação positiva entre exposição da mídia e o desenvolvimento do adolescente.

Outro aspecto positivo é que a interatividade à distância proporcionada pelas mídias digitais ajuda a desenvolver aspectos comunicacionais e de engajamento nos adolescentes. Eles podem se comunicar com parentes distantes e fazer novos amigos. Semelhantemente, eles podem adquirir maior compreensão da realidade do mundo que os cerca, desenvolver empatia para com quem difere deles e a se engajarem civicamente em causas nobres.

Sem dúvida existem vários outros aspectos positivos no uso das mídias digitais pelos adolescentes e que não foram explorados aqui. A seguir serão exploradas algumas das principais preocupações dos pais e educadores.

Como os adolescentes entendem as mídias, quais são os riscos e os benefícios do digital.
Imagem: ShutterStock

Preocupações com as mídias digitais

Saúde

A Internet e as redes sociais apresentam benefícios e riscos para a saúde. Os adolescentes que se sentem excluídos por alguma razão (obesidade, doença mental ou alguma característica física) podem encontrar grupos de apoio para interagir com outros e sentirem-se valorizados. Obviamente também existe o risco das informações equivocadas, de sofrerem hostilidade e receberem más influências. Por exemplo, existem sites, fóruns e grupos que promovem apoio e informação para quem sofre de bulimia e anorexia, mas também existem os que motivam essas práticas (pro-mia, pro-ana).

Autismo. As mídias digitais também podem ser aliadas para alguns pais que possuem dificuldade para ensinar e se comunicar com os filhos autistas. Entretanto, os adolescentes autistas têm problemas com o uso excessivo e é necessário o uso equilibrado com limites[6].

Sedentarismo e Obesidade. O excesso de uso das mídias está ligado à obesidade e ao risco cardiovascular em adolescentes. O sedentarismo e a exposição aos anúncios de alimentos não saudáveis estão entre as principais causas. Consequentemente, reduzir o tempo gasto com as telas é um estratégia bem-sucedida de combate à obesidade infantil e adolescente[7].

Imagem: ShutterStock

Distúrbios do sono. Estudos também revelam que o uso intenso da Internet, redes sociais e a presença de smartphones nos quartos estão associados aos problemas de sono entre adolescentes. Eles levam mais tempo para dormir, a qualidade do sono é pior, as atividades do dia são prejudicadas e aparecem sintomas de depressão. O excesso no tempo de uso durante o dia também prejudica o sono[8].

Álcool e tabaco. Pesquisas mostram que a exposição a cenas de uso de álcool ou tabaco e a comportamentos sexuais arriscados está associado ao início destes comportamentos.   Especialmente nas redes sociais, empresas de bebidas alcoólicas mantem forte propaganda em anúncios direcionados ao público mais jovem[9].

Multitask. Apesar de suas habilidades metacognitivas, os adolescentes são bastante ingênuos sobre como podem estudar para um exame enquanto monitoram o Tiktok ou Instagram, enviam mensagens e ouvem música, tudo ao mesmo tempo[14]. Os estudantes que estão administrando vidas atarefadas podem pensar que estão realizando mais, porém descobertas sugerem que eles realmente precisarão de mais tempo para alcançar o mesmo nível de desempenho em uma tarefa acadêmica.  Em outras palavras, a execução de várias atividades simultâneas não economiza tempo, apenas divide a atenção e estressa.   

Depressão. Uma pesquisa examinou a relação entre o uso da mídia e a depressão e encontrou uma correlação positiva[10]. Adolescentes que utilizaram as mídias sociais passivamente, apenas visualizando o conteúdo, relataram declínios no sentimento de bem-estar e satisfação com a vida, enquanto aqueles que utilizaram ativamente as mídias sociais para interagir com os outros e postar conteúdos não experimentou estes sentimentos. Outro estudo constatou que adolescentes que utilizaram o Instagram para seguir estranhos e para a comparação social tinham uma depressão mais elevada[11].

Estas pesquisas ilustram que, além do número de horas gastas em mídia social, outro fator chave é como o adolescente utiliza as mídias sociais.

Imagem: ShutterStock

Segurança e Privacidade

Geralmente os adolescentes não querem se expor no mundo digital. Eles preferem a privacidade porque não querem ser monitorados pelos pais e outros adultos. Contudo, não sabem exatamente o que significa exatamente a privacidade. As fotos que eles expõem nas redes sociais demonstram isso. Pesquisas revelam que os adolescentes confiam que as redes sociais irão protege-los e, por isso, não alteram ou revisam as configurações de privacidade[12].  

O cyberbullying e o sexting (transmissão desautorizada de imagens de nudismo ou seminudismo, assim como textos sobre intimidade sexual) podem ser resultantes da falta de conhecimento em questões de segurança e privacidade. Esse é um problema muito presente entre os adolescentes e cabe aos pais e educadores discutir claramente o assunto e orientar ações preventivas.

Imagem: ShutterStock

Pornografia

Predadores online conseguem acesso a crianças e adolescentes através das redes sociais, salas de bate-papo, e-mail e games online. Esses criminosos costumam se apresentar como outras crianças para ganhar a confiança da vítima. As consequências podem ser abuso sexual, sequestro, estorção ou o sexting.  Uma vez que o adolescente compartilha imagens íntimas com eles, a imagem irá circular por vários locais na Internet e dificilmente poderá ser interrompida sua propagação. A exploração sexual online é um crime com severas punições, mas com danos irreparáveis. Qualquer suspeita que os pais possuam, precisam reportar as autoridades locais (https://new.safernet.org.br/content/delegacias-cibercrimes).

É sabido que a pornografia cresce entre os adolescentes. O envolvimento nessa prática tem começado cada vez mais cedo e causado vários problemas para o desenvolvimento físico e mental, bem como para a valorização da mulher na sociedade [13].

Conclusão

Os efeitos do uso da mídia sobre os adolescentes são multifatoriais e dependem do tipo de mídia, do tipo de uso, da quantidade e extensão do uso, e das características individuais de cada um.  Para promover a saúde e o bem-estar dos adolescentes, é importante manter a atividade física adequada, alimentação saudável, boa higiene do sono e um ambiente social estimulante. Não é recomendada a abstenção da mídia, mas o equilíbrio adequado entre o tempo de tela e outras atividades. Também é essencial estabelecer limites de acesso ao conteúdo, orientar sobre os riscos da exibição de informações pessoais, incentivar o pensamento crítico adequado à idade, facilitar a alfabetização digital, e apoiar a comunicação familiar aberta e a implementação de regras consistentes sobre o uso da mídia.

A plataforma Feliz7play.com e 7cast.com são opções de conteúdo educativo e religioso para o público adolescente.

Imagem: ShutterStock

Referências

[1] Children and Adolescents and Digital Media. https://pediatrics.aappublications.org/content/138/5/e20162593  

[2] Brasil tem 24,3 milhões de crianças e adolescentes que usam internet. https://www.folhape.com.br/noticias/brasil-tem-243-milhoes-de-criancas-e-adolescentes-que-usam-internet/116576/

[3] Playing an Action Video Game Reduces Gender Differences in Spatial Cognition. https://www.researchgate.net/publication/5949257_Playing_an_Action_Video_Game_Reduces_Gender_Differences_in_Spatial_Cognition

[4] Action video games and informal education: Effects on strategies for dividing visual attention. https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/0272431687073007

[5] What is Rock Music Doing to the Minds of our Youth? A First Experimental Look at the Effects of Rock Music Lyrics and Music Videos. https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/0272431687073007

[6] Digital Media and Autism Spectrum Disorders: Review of Evidence, Theoretical Concerns, and Opportunities for Intervention. DOI: 10.1097/DBP.0000000000000664

[7] Adolescent sedentary behaviors: correlates differ for television viewing and computer use. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/23260837/

[8] Sleep and use of electronic devices in adolescence: results from a large population-based study. https://bmjopen.bmj.com/content/5/1/e006748

[9] Exposure of children and adolescents to alcohol marketing on social media websites. https://academic.oup.com/alcalc/article/49/2/154/205820

[10] Lin LY, Sidani JE, Shensa A, et al.Association between social media use and depression among U.S. young adults. Depress Anxiety. 2016;33(4):323–331

[11] Instagram #Instasad?: Exploring Associations Among Instagram Use, Depressive Symptoms, Negative Social Comparison, and Strangers Followed. https://www.researchgate.net/publication/276208382_Instagram_Instasad_Exploring_Associations_Among_Instagram_Use_Depressive_Symptoms_Negative_Social_Comparison_and_Strangers_Followed

[12] Social Privacy in Networked Publics: Teens’ Attitudes, Practices, and Strategies. https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1925128

[13] Impactos da pornografia na saúde dos adolescentes: Uma análise a partir dos direitos fundamentais. http://www.puc-rio.br/pibic/relatorio_resumo2016/relatorios_pdf/ccs/DIR/DIR-Carolina_Dias.pdf

[14] Can students really multitask? An experimental study of instant messaging while reading. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0360131509002656

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